Artes Marciais e Guitarra

Por Júlio Vallim
GuitarCoast


As artes marciais - oriundas do Oriente - sempre foram caracterizadas por seu forte senso de disciplina, persistência e paciência. Ora, o que mais seria melhor no estudo da guitarra do que esses itens?

No estudo da guitarra o instrumentista deve empreender e praticar sua atitude de persistência ao treinar as técnicas mais complicadas, precisa ter paciência ao executar o treinamento dessas técnicas, assim como necessita de uma rigorosa disciplina em relação a sua forma de estudar. A filosofia marcial tem muito a ensinar aos músicos, seja qual for o instrumento, quanto às atitudes corretas e direcionadas a um melhor aproveitamento de seu tempo de estudo, e prática no quesito aprendizagem e crescimento musical de um indivíduo.

No Kung Fu, por exemplo, existem as formas (relacionadas à maneira do praticante marcial se posicionar em uma luta) caracterizadas por gestos e posicionamento do corpo; na música o instrumentista deve prestar atenção quanto a sua posição - desde a maneira como segura o instrumento até a posição das mãos, coluna, pernas - a fim de aproveitar o máximo de seu corpo sem prejudicar sua saúde, posteriormente. Uma posição errada do pescoço, braços e coluna pode acarretar contusões com o passar do tempo.

Além disso, na filosofia de uma luta oriental é preciso regrar uma rotina de treinamento com afinco, apenas dessa forma a ascensão é possível. Na música ocorre o mesmo: o músico deve projetar uma forma associada ao seu estudo, regrando o tempo e apresentando subdivisões do mesmo. Desse jeito, torna-se viável o aprendizado das diferentes técnicas e um conhecimento aprimorado das mesmas.

O pensamento interior que é projetado em um lutador marcial é o de que ele jamais deve pensar em como os outros lutam ou tentar focar em ser melhor que outrem, pois esse foco é totalmente equivocado e limita ao praticante atingir o máximo de sua habilidade. Na música, muitas vezes, vemos e ouvimos certas discussões irrisórias, do tipo: fulano ou cicrano, quem é o melhor? Levantar essas questões, segundo a teoria oriental, é a maior prova de que o indivíduo possui uma insegurança ou medo de não atingir seu limite e por isso retira o foco de si, colocando-o nos outros. Você jamais deve pensar em tocar como o guitarrista A ou melhor do que o guitarrista B, o foco deve ser direcionado a tirar o melhor de você, foque na sua prática e aprendizado, não em outros porque isso jamais lhe trará ascensão.

A meditação e concentração - elementos essenciais em toda filosofia do oriente - também contribuem de forma absurda a uma maior progressão do instrumentista a fim de que ele adquira reflexão sobre seus pontos mais fortes ou naquilo que ele mentaliza melhorar. É fundamental a concentração e o direcionamento: nas artes marciais devemos praticar muitas vezes o mesmo movimento, seja um soco, chute ou forma; no estudo de um instrumento não é diferente... O ser deve repetir, repetir, repetir... refletir, refletir, refletir... Não basta executar uma frase 30 vezes se não procuramos ouvi-la. No Kung Fu utilizamos um espelho a fim de obter uma visão do movimento executado, na guitarra o ideal é gravarmos tudo o que é treinado, grave, ouça, toque, grave novamente e ouça. Compare a evolução de um mesmo trecho tocado em um dia e duas semanas após esse, pois isso fará com que realmente possa observar o resultante do estudo e se o direcionamento está correto.

Assim sendo, é possível observar que podemos retirar muito de uma filosofia oriental para a vida, seja no estudo da música ou no modo que encaramos o dia a dia e nossas tarefas. Uma forma aplicável do Oriente seria mentalizar algo que estudamos, você pode estar em um ônibus e pensar naquele solo que está tirando, desde a sua execução ao tempo até a palhetada. Isso funciona até mesmo para que se mentalize mais rapidamente uma música inteira na cabeça. Funciona mesmo, pense nele antes de dormir e quando acordar. Temos muito a aprender com as artes marciais, elas podem nos ajudar bastante.

Autor: Júlio Vallim

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